sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Bullshit!

Lendo meu integrador de notícias há pouco, deparo com um texto de Eliane Tacanhêde, reproduzido por Augusto Nunes. Respeito muito o Augusto e nada à Eliane, como se pode notar pela forma como grafo seu nome. Ser tacanha é tão somente a melhor das sua qualidades. Comento a íntegra do seu texto destacado

Brincando com fogo

07:17 | Augusto Nunes reproduz artigo de Eliane Cantanhêde (publicado no Estadão)

Quem brinca com fogo pode se queimar, mas quem está saindo chamuscado das propostas do presidente eleito Jair Bolsonaro não é ele, mas o Brasil. O duro artigo do governo da China e o duríssimo cancelamento de uma visita oficial do chanceler brasileiro ao Egito devem acender o sinal amarelo no QG de Bolsonaro, que tem uma grande vantagem: sabe recuar. Pois é hora de recuar. Política externa é “ de Estado” , não “ de governo” , mas é óbvio que novos presidentes têm direito de fazer ajustes, calibrar o tom e deixar a sua marca nas relações com o mundo. Só não podem dar cavalo de pau, porque política externa se faz com credibilidade e estabilidade, para não atrair retaliações imediatas ou perda de imagem do País a médio prazo.

O que dizer? Discordo peremptoriamente. Tomemos a China como exemplo daquilo que Tacanhêde quer nos ensinar. A China não chegou onde chegou fazendo concessões aos outros, bem ao contrário. Quem pretende ser grande, quem se dispõe a jogar o jogo dos grandes, quem quer se mostrar no palco principal, na quadra central, não se apresenta de cócoras como quer esta senhora. Essa conversa de "política externa é de Estado, não de governo" é mera retórica de quem nada sabe dos jogos de poder, reles platitude. Eliana deve ter lido muito Maquiavel sem saber que ele foi um tremendo fracasso como aconselhador de príncipes e potentados. Eliana, melhore seus autores.

Aliás, se Bolsonaro condena a política externa ideológica do PT, ele não pode incorrer no mesmo erro, com uma política externa igualmente ideológica, no sentido inverso. Também não convém ignorar que o governo Temer já promoveu uma guinada de pragmatismo, reaproximando Brasília de Washington e afastando de Caracas.

Mas onde é que esta senhora viu ideologia? O que tenho visto, isto sim, é pragmatismo, patriotismo; nacionalismo se achar melhor. Por os interesses da Nação em primeiro lugar — e isto inclui mostrar aos de fora os nossos próprios interesses, e que nosso País não é um armazém de secos e molhados onde eles podem se servir — faz parte da retórica. Foi assim que Trump criou a #MAGA — Make America Great Again.

Entre as bombas acionadas pelas falas de Bolsonaro na área internacional destaca-se a transferência da embaixada de Tel-Aviv para Jerusalém, rompendo décadas de neutralidade do Brasil no Oriente Médio, a favor de Israel e contra os Países Árabes, que têm fortes laços comerciais e culturais aqui.

O Egito ─ um dos árabes mais moderados ─ já chutou o pau da barraca, cancelando o convite para o chanceler Aloysio Nunes Ferreira ir ao país nesta semana com dezenas de empresários que, inclusive, já estavam no Cairo. E tudo por um voluntarismo de Bolsonaro. Mudar a embaixada para Jerusalém não muda absolutamente nada a favor do Brasil. Muito ônus para zero bônus. Aliás, só a Guatemala e os EUA de Donald Trump fizeram isso. O Paraguai, que tinha feito, já voltou atrás.

Uma lembrança a quem faltou à aula: o Egito não é árabe, é islâmico, o mais próximo de "árabe" que chegaram, mas o que são detalhes para quem é tão rasa? Depois, como já nos lembrou o Presidente-Eleito, quem escolhe qual é sua capital é o povo (via governo) de uma Nação, não é seu vizinho ou países com os quais você mantém relacionamento. O Egito, para citar um, já teve outras capitais antes do Cairo, mas Eliane ainda não existia, a tempo de tecer suas papalvices.

Tome os países do Oriente Médio e pergunte a si quais são realmente importantes. Você encontrará uns três ou quatro, que não nominarei, e nenhum deles é o Egito. Se todos eles, inclusive esses que não nominei, resolvessem retaliar o Brasil por mudar sua embaixada em Israel para Jerusalém, provocariam um impacto em nossa economia tal e qual aquele que a Turquia (outro país que não é árabe mas islâmico) provocou na União Europeia, isto é, nenhum ou quase nenhum.

Israel, por sua vez, tem tecnologia de ponta que muito nos falta, como a de agricultura em terras áridas e semiáridas como as do Nordeste. Eles também são extremamente avançados na área militar, aeroespacial, inteligência e contraespionagem. Para resumir: em relações internacionais, não é a "neutralidade" que conta ou se respeita. Esta é a política que sempre deu errado para nós brasileiros e o que o futuro governo Bolsonaro pretende é virar esse jogo a nosso favor. Os "árabes", como ela diz, compram basicamente carne de frango do Brasil. Se resolverem comprar frango de outrem, eu me pergunto, no armazém de quem, cara-pálida?

E mais, apesar de não ter sido mencionado pela "jornalista", está em jogo a "embaixada" palestina em Brasília. Nenhum outro país, nem mesmo Israel, pediu que tal estrovenga fosse removida, mas acredito que será. Nada contra os palestinos, é uma questão de detalhe: a Palestina não é um Estado e por não o ser não lhe cabe uma representação diplomática. É que Lula, a quem Tacanhêde nunca criticou por sua política externa, não era dado a detalhes outros que os de rapina.

Outra bomba de Bolsonaro é acenar para Taiwan e dizer que “ a China pode comprar no Brasil, mas não comprar o Brasil” . Em texto pouco usual no China Daily, seu porta-voz extraoficial, o governo chinês ameaçou retaliar e lembrou que a China é o nosso principal parceiro comercial, com um superávit mais do que favorável ao Brasil, e os dois países não competem entre eles, ao contrário, têm economias e interesses complementares.

Uma pessoa a quem muito respeito no que concerne à China é o Dr. Heitor de Paola. Uma vez ele disse, num dos seus muitos podcasts, que a China era um "tigre de papel" e que "muito do poderio econômico chinês não passava de poderio americano com mão-de-obra chinesa." Perfeito! Disse o mesmo no meu artigo O "Império do Centro" visto de dentro de quase sete anos atrás. Em que pese que a China é um grande exportador de manufaturados e um grande importador de commodities, a pergunta a fazer é: de quem mais vão comprar, para quem mais vão vender; ou ainda melhor: onde arrumar um país com 208 milhões de almas para quem vender e que, por acaso, é o 2º maior produtor de comida e o 1º de minérios do mundo?

Está em pauta a extradição de Cesare Battisti, que agrada a Itália e depende do STF, mas Bolsonaro já desativou três outras bombas: não fala mais em retirar o Brasil da ONU, que seria um escândalo; romper com o Acordo de Paris, no qual o Brasil defende não só os interesses do mundo, mas os seus próprios, inclusive do agronegócio; e unir Agricultura e Meio Ambiente, que foi um susto para a União Europeia, forte importadora de carne e soja e ciosa da sustentabilidade do planeta.

O STF, que eu saiba, já se pronunciou a respeito de Battisti. Lá atrás, ainda no desgoverno Lula, o STF afirmou que ele deveria ser extraditado. O problema foi que o analfabeto presidente confundiu as bolas. Quando o Supremo disse que a extradição era uma prerrogativa do Presidente da República quis dizer que os atos de extradição são, pela nossa Constituição, um ato do Chefe de Estado que, por acaso, é o Presidente. O boçal de menos dedos achou que era uma decisão discricionária dele e deixou o terrorista assassino entre nós. Digamos que Eliane e Lula tenham o mesmo entendimento da Lei por similitude intelectual.

Quanto à ONU, Acordo de Paris e o que a Europa possa pensar sobre a sustentabilidade do planeta, cabe perguntar: que bem nos fez a ONU, o Acordo de Paris ou o zelo europeu pela sustentabilidade? Acho que o mesmo dos muitos pés de pequi poupados em nome do nosso subdesenvolvimento.

Quanto à ameaça de Bolsonaro de simplesmente romper relações com Cuba, ela não pareceu tão absurda assim para experientes diplomatas brasileiros, que ridicularizam a “ grande democracia cubana” boicotando o Brasil em defesa do PT. Afinal, foi Havana quem retirou sua embaixadora de Brasília após o impeachment de Dilma Rousseff e jamais concedeu agrément para o embaixador Fred Meyer, um amigo de Cuba.

Que alívio! Pensei que jamais concordaríamos em alguma coisa…

Fora isso, Bolsonaro está causando tanto ruído, à toa, por três motivos: desconhecimento de política externa, aliança com os evangélicos e um alinhamento, mais do que político, quase psicológico, a Trump. Vale dizer que, afora pequenos hiatos, o Brasil jamais teve alinhamento automático com nenhum parceiro, nem com a grande potência.

Quem está fazendo ruído é a imprensa que perdeu as eleições, gente como Eliana Tacanhêde que pode acabar no olho da rua por simples economia de dinheiro ou de espaço. Bem ao contrário do que se afirmou no parágrafo anterior, Bolsonaro é o único político desde Geisel (que me lembre) a dar importância à geopolítica e às relações internacionais. Admito, é um vespeiro, mas pode-se escolher ser um anão ou um gigante, mesmo que este último esteja mais propenso a ferroadas. Ser tacanho é ser baixo, não é mesmo Eliane?

“ Brasil acima de tudo, Deus acima de todos” , diz o bordão de Bolsonaro. Em política externa, é “ o interesse do Brasil acima de tudo e de todos” , inclusive das ideologias que, assim como vêm, também vão.

Finalmente, o final. Eliane fecha seu discurso de campanha desdizendo tudo aquilo que criticou nos parágrafos anteriores. É claro que são os interesses do país que prevalecem, não o discurso ideológico de sempre. Esse pessoal de imprensa mambembe, esses "jornalistas" rastaqueras, bajuladores do poder não conseguem aguentar o protagonismo de um milico (como dizem) à frente de um país que não se contenta mais em parecer grande, mas em ser grande. Quando foi a última vez que um Presidente dos Estados Unidos da América veio a uma posse de um Presidente daqui? Nunca, não é mesmo? Quando foi que um Primeiro Ministro de Israel veio aqui? Mesma resposta? Pois serão mais de oitenta chefes de estado e de governo inscritos para a posse de Bolsonaro. Talvez o ditador do Egito não venha, nem o Rei da Jordânia, mas na boa, não sentiremos a falta.

E ao Augusto Nunes a quem muito prezo, um conselho: cuidado com quem andas e com os textos que replicas. Este acima, o qual dificilmente leria se não fosse por você, só encontrei platitudes e parvoíces, ou como dizem os rednecks do Norte: BULLSHIT!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Todos os comentários são bem-vindos — inclusive anônimos —, sejam para criticar, corrigir, aplaudir etc. Peço apenas que sejam polidos, pertinentes à postagem e que não contenham agressões ou ofensas.