Li agora há pouco uma coluna do Carlos Chagas sobre a instalação da Comissão da Verdade. Despretensiosa a meu ver, ela mexeu com minhas lembranças do passado e com minha consciência do presente. Seguem abaixo algumas linhas desses meus devaneios.
Dizem que retirar a casca da ferida
ajuda sua cicatrização. É verdade. Nós fazemos isso
instintivamente e até os símios o fazem, às vezes com auxílio do
outros. Entretanto, é preciso ter cuidado. Se a casca ainda estiver
aderida, a ferida reabre e supura.
Algo me diz que a democracia da qual
usufruímos nasceu do reconhecimento dos erros cometidos de parte a
parte, dos excessos de ambos. Chegou-se ao consenso de que o melhor
seria passar a borracha e recomeçar do zero. Naquela época, ainda
na minha juventude, não gostei. Queria a "minha" revanche.
Hoje não penso assim.
Aprendi que "ganhar o jogo"
ou "ter a última palavra" pode não ser o mais importante.
Afinal, a vida é sempre mais longa que um momento da história. Vejo
opiniões aqui e ali "exigindo a verdade", sem se preocupar
se uns quinze minutos de fama e glória, valerão o presente
conquistado. Isto me preocupa.
Aprendemos com erros e acertos. Temos
entre nossos ditados um que diz "em time que está ganhando não
se mexe", então por que revirar o lixo da história se o seu
cheiro já não incomoda? Sabemos o que se passou. O que se arrisca é
o risco de inflamar as feridas ao querer apressar sua cura. Hoje,
passado já tanto tempo, eu ainda as deixaria como estão, curando-se
lentamente, porque o risco de uma nova inflamação — assim eu
penso — pode nos ser insuportável.
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