quinta-feira, 13 de abril de 2017

Manifesto à Nação


Impõe-se a mobilização da sociedade por uma Constituinte originária e independente

Modesto Carvalhosa, Flávio Bierrenbach e José Carlos Dias
O Estado de S.Paulo
09 Abril 2017 | 05h00

Os constantes escândalos comprovam a inviabilidade do vigente sistema político-constitucional. Ele representa um modelo obsoleto, oligarca, intervencionista, cartorial, corporativista e anti-isonômico, que concede supersalários, foros privilegiados e muitos outros benefícios a um pequeno grupo de agentes públicos e políticos, enquanto o resto da população não tem meios para superar a ineficiência do Estado e exercer seus direitos mais básicos.

A Constituição de 1988 transformou a burocracia num obstáculo perverso ao exercício da cidadania. Ela é fruto de um momento histórico bastante peculiar, o fim de um regime de exceção, que não corresponde mais à realidade do Brasil; representa um conjunto de interesses e modelos que já em 1988 estavam em franca deterioração no mundo civilizado.

Por ser um compromisso de interesses entre as forças que disputavam o poder após a ditadura, a Carta de 88 foi recheada de casuísmos e de corporativismos . Estabeleceu um absurdo regime político que se nutre de um sistema pseudopartidário, excessivamente fragmentado e capturado por interesses de corporações e de facções político-criminosas. Isso torna excessivamente custosa a governabilidade, criando uma relação tóxica entre os Poderes, o que favorece a corrupção, o tráfico de influência e os rombos devastadores nas contas públicas.

Os vícios insanáveis de Carta de 88 fizeram com que ela tenha sido desfigurada por 95 emendas desde sua promulgação, tramitando atualmente mais de mil novos projetos de emendas constitucionais. No entanto, tais emendas são paliativos lentos e pontuais, que apenas retardam as verdadeiras estruturais necessárias.

Os temas constitucionais para uma reforma estrutural, política e administrativa, indispensável à restauração das instituições, são, dentre outros:

  1. Eliminação do foro privilegiado;
  2. Eliminação da desproporção de deputados por Estados da Federação;
  3. Voto distrital puro, sendo os parlamentares eleitos pelo distrito eleitoral respectivo;
  4. Referendo no caso de o Congresso legislar em causa própria, sob qualquer circunstância;
  5. Estabelecimento do regime de consulta, com referendo ou plebiscito, para qualquer matéria constitucional relevante;
  6. Nenhum parlamentar poderá exercer cargos na administração pública durante o seu mandato;
  7. Eliminação dos cargos de confiança na administração pública, devendo todos os cargos ser ocupados por servidores concursados;
  8. Eliminação do Fundo Partidário e do financiamento público das eleições: serão os partidos financiados unicamente por seus próprios filiados;
  9. Eliminação das emendas parlamentares, que tornam os congressistas sócios do Orçamento, e não seus fiscais;
  10. Criação ou aumento de impostos, somente com referendo;
  11. Fim das coligações para quaisquer eleições;
  12. Eliminação de efeitos de marketing das campanhas eleitorais, devendo os candidatos se apresentar no horário gratuito pessoalmente, com seus programas e para rebater críticas;
  13. Distribuição igual de tempo por partido no horário eleitoral gratuito para as eleições majoritárias (presidente e governador);
  14. Inclusão do princípio da isonomia na Constituição, de modo que a lei estabeleça tratamento igual para todos, em complementação ao princípio vigente de que todos são iguais perante a lei;
  15. Isonomia de direitos, de obrigações e de encargos trabalhistas e previdenciários para todos os brasileiros, do setor público e do setor privado;
  16. Eliminação da estabilidade no exercício de cargo público, com exceção do Poder Judiciário, do Ministério Público e das Forças Armadas, devendo os servidores públicos se submeter às mesmas regras do contrato trabalhista do setor privado;
  17. Eliminação dos privilégios por cargo ou função (mordomias, supersalários, auxílios, benefícios, etc.), devendo o valor efetivamente recebido pelo servidor estar dentro do teto previsto na Constituição.

Todos sabemos que essas mudanças jamais serão aprovadas pelos atuais parlamentares, que atuam só para manter o vigente sistema político-constitucional, que preserva seus privilégios. Por isso somente poderemos fazer as reformas estruturais políticas e administrativas indispensáveis com uma Constituinte composta por membros da sociedade civil que não ocupem cargos políticos e, encerrados os trabalhos constituintes, fiquem inelegíveis por oito anos.

A viabilização dessa indispensável providência de restauração das instituições, desfiguradas pela ilegitimidade manifesta da maioria dos atuais congressistas, que nada mais representam senão seus próprios interesses de sobrevivência política e criminal, passa pelo plebiscito instituído na Lei n.º 9.709, de 1998.

O plebiscito deverá ser convocado por iniciativa de um terço dos deputados ou dos senadores e aprovado por maioria simples dos membros de uma das Casas do Congresso. Nele os eleitores deverão decidir pela convocação de uma Assembleia Constituinte independente, formada por pessoas que não tenham cargos políticos, ou, então, por uma Assembleia Constituinte formada pelos próprios congressistas. Esta será a única pergunta a ser formulada na cédula.

A redação da Constituição de um Estado é a máxima expressão da soberania de um povo. Quando o povo não participa de sua elaboração, temos uma Constituição discriminatória, de privilégios para casta política e administrativa, como a de 1988, que criou não uma democracia representativa, mas, sim, uma democracia corporativista.

Impõe-se, enfim, uma mobilização da sociedade civil e organizada que exija do Congresso Nacional a realização de um plebiscito, nos termos da Lei 9.709/98, para que o povo decida, soberanamente, se quer uma Assembleia Constituinte originária e independente, que estabeleça as novas estruturas para o desenvolvimento sustentável do nosso país, num autêntico Estado Democrático de Direito.

 

Meu Pitaco

Quando soube da publicação do texto acima, do último Domingo, já era Terça, 11. Passei o fim de semana fora numa fazenda sem as comodidades do acesso à Internet e ao celular. Retiro total. Mesmo assim, nada me impede de tecer comentários a ideias tão lúcidas.

Alguns de vocês devem se perguntar: "Outra Constituição?!" É verdade. A Constituição de 88 já é a nossa sétima ou oitava. O Brasil, desde a sua independência, teve sete Constituições: as de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e 1988. Alguns consideram como uma oitava Constituição a Emenda nº 1, outorgada pela junta militar, à Constituição Federal de 1967, que teria sido a Constituição de 1969. Por que então falar em mais uma?

A resposta é óbvia: Porque todas as sete ou oito, passadas ou em vigor, falharam na função única e não outorgável de desenhar e organizar o Estado. As razões são várias, mas se o leitor reler o antepenúltimo parágrafo do brilhante texto acima, verá uma dessas falhas, aliás, a principal responsável pelo fiasco da Constituição de 88.

Lá está dito e eu grifo: "Nele os eleitores deverão decidir pela convocação de uma Assembleia Constituinte independente, formada por pessoas que não tenham cargos políticos, ou, então, por uma Assembleia Constituinte formada pelos próprios congressistas."

Ao dar poderes constituintes aos parlamentares, matamos a Constituição por nascer. O saudoso Dr. Ulysses, de quem não tenho saudade alguma, foi um dos pais dessa ideia. Tancredo foi outro. Eles temiam uma revanche militar de última hora. Não houve, nunca foi sequer cogitada. Fale-se o que quiser dos militares mas eles honram a palavra dada.

De volta ao erro que foi "dar poderes constituintes aos parlamentares", é preciso salientar que este foi um dos seus vícios de origem. Os parlamentares fizeram uma Constituição de conveniência, uma para chamar de sua, e não uma Constituição para atender ao povo e ao Estado.

Meu modelo de Constituição é a dos Estados Unidos da América. Se o leitor se dispuser a ler algumas das nossas, quaisquer das sete ou oito, verá que elas compreendem uma série de direitos e prerrogativas CONCEDIDAS pelo Estado ao cidadão ou ao establishment burocrático. A dos EUA, bem ao contrário, é uma relação de LIMITES deste Estado, do establishment. É uma diferença brutal e é a razão pela qual países de mesma idade têm, de um lado, uma Constituição de mais de duzentos anos, com apenas sete (7!) artigos e vinte e sete (27!) emendas. Do outro, nós já sabemos…

Lá está, de forma sucinta e clara, o que o Estado NÃO PODE FAZER, nada mais. Isto quer dizer que os direitos naturais do indivíduo, assim como os direitos coletivos dos estados-membros precisam ser respeitados pela União. A Liberdade e a Independência foram os paradigmas da concreção daquela União. E aqui? Aqui não! Aqui foi ou é uma concessão, uma condescendência das oligarquias, das classes dominantes. Povo e Estado que se danem.

E para finalizar, porque o texto se alonga, quero concordar com todas as dezessete (17) proposições dadas acima, mas não creio que sejam matéria constitucional . A maioria delas — salvo três ou quatro — visam retirar "DIREITOS CONCEDIDOS" — ERRONEAMENTE — PELA CONSTITUINTE DE 88; feita por parlamentares, para parlamentares e para seu uso e gozo. Fazer uma Constituição para dar direitos é ERRADO. O máximo que ela pode fazer é RECONHECER direitos existentes. Se ela é fruto da VONTADE DO POVO, nada pode dar a este mesmo povo que ele já não tenha. O contrário disso é o que chamo VÍCIO DE ORIGEM.

Minha sugestão: Que seja alterada a redação da Convocação: "Que o povo decida, soberanamente, se quer uma Assembleia Constituinte originária e independente, formada por pessoas que não tenham cargos políticos, ou, então, pela convocação de tradutores competentes e juramentados para traduzir — eadem verba et eadem commatibus 1 — a consagrada Constituição dos Estados Unidos da América."

Podem torcer o nariz, mas custará menos, será mais rápida e é de qualidade inquestionável. É como a roda: ainda não inventaram nenhuma melhor que a redonda, razão única para ser copiada.

 

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  1. Pelas mesmas palavras e até pelas mesmas vírgulas. (N.T.)

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