O verdadeiro golpe no Paraguai
por Sandro Vaia (*)
A TV estatal do Paraguai ficou 26 minutos fora do ar por falta de energia elétrica e os alucinados constitucionalistas da Constituição alheia que cresceram como erva daninha nas redes sociais, viram isso como um sintoma de “repressão” e atentado às liberdades públicas.
Nunca se viu um golpe de Estado tão modorrento. Fora dos protestos protocolares de partidários do presidente deposto, o Paraguai continuou levando a sua vida de rotina.
O microfone da TV pública ficou aberto, o ex-presidente protestou diante de suas câmeras, o Congresso fez tudo dentro da normalidade, a Suprema Corte disse que tudo foi feito dentro da normalidade e até o advogado do deposto disse que tudo foi feito dentro da normalidade.
Mas muita gente não gosta da normalidade paraguaia e insiste em chamar de golpe uma decisão tomada por mais de 90% dos parlamentares, que se basearam rigorosamente na letra do artigo 225 da Constituição de seu país.
Dizem que foi tudo muito rápido e surpreendente. Que não houve tempo para defesa. Que o rito foi muito sumário. Mas tudo está previsto na Constituição, que dá ao Senado a atribuição de fixar o rito para o julgamento, o que foi feito através da Resolução 878.
O que resta dizer? Que a Constituição é de mau gosto e “disgusting” ao fixar um etéreo “mau desempenho” como motivo de impeachment?
Que o Legislativo paraguaio não tem polidez, educação e bons modos ao dar tão pouco prazo para a defesa do acusado?
É um pouco de cinismo e hipocrisia achar que dar mais tempo de defesa ao presidente destituído poderia salvá-lo do impeachment.
A queda dele foi resolvida por razões políticas, e nem 400 dias de prazo de defesa poderiam salvá-lo. Ele simplesmente perdeu catastroficamente o apoio político de sua base de sustentação e a votação do processo de impeachment apenas confirmou que ele perdeu as condições mínimas de governabilidade.
Se a Constituição do Paraguai tem um defeito, ele é de concepção: fixou critérios quase parlamentaristas para julgar um governo presidencialista. O presidente ganhou um voto de desconfiança – que apelidaram de “mau desempenho”- e caiu.
Como provar alguma coisa como “mau desempenho” se não através de critérios puramente políticos?
Essa é a Constituição que o Paraguai tem, não a que os palpiteiros da UNASUL acham que deveria ter.
Na Venezuela, por exemplo, casuísticas normas eleitorais permitem que 51% dos eleitores elejam 66 deputados enquanto 49% elegem 96 deputados- do partido do governo, claro. Alguém reclamou?
Enquanto a normalidade da vida democrática foi mantida no Paraguai e o próprio Lugo anunciou que pretende candidatar-se de novo nas eleições de abril de 2013, além de manifestar-se contra sanções econômicas contra seu país, a UNASUL e o Mercosul afastam o Paraguai de seu convívio, com a aquiescência bovina da diplomacia brasileira, a reboque do ativismo “bolivariano”.
É fácil concluir qual é o verdadeiro golpe no Paraguai e qual é seu objetivo: afastar o único obstáculo à entrada da Venezuela no Mercosul.
As tais “cláusulas democráticas” só valem para enquadrar os inimigos. Para os amigos, nem a lei.
(*) Sandro Vaia é jornalista. Foi repórter, redator e editor do Jornal da Tarde, diretor de Redação da revista Afinal, diretor de Informação da Agência Estado e diretor de Redação de “O Estado de S.Paulo”. É autor do livro “A Ilha Roubada”, (editora Barcarolla) sobre a blogueira cubana Yoani Sanchez. E.mail: svaia@uol.com.br
domingo, 1 de julho de 2012
O verdadeiro golpe
Pesquei este artigo ontem, mas como já tinha escrito bastante, deixei para publicar hoje — dia em que pretendo descansar. Aliás, o mote do texto que repasso a vocês já foi tratado aqui mesmo.
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