sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Alguém do setor elétrico pode me desmentir?

No dia 13 do mês passado (tinha que ser um 13) eu postei uma charge do Roque Sponholz sobre o horário de verão que se iniciava. Como está lá escrito, eu detesto a estrovenga. Não há nesse mundo argumento algum que me convença que tal medida tenha qualquer efeito prático aqui. No meu entender, ele não promove economia para o consumidor de energia, aliás, bem ao contrário. Ele não evita que ocorram apagões e outras falhas no sistema elétrico nacional — já experimentamos um, recentemente, aqui na região da Grande Belo Horizonte, e por aí vai. Na opinião desse escriba é só mais uma contrafação, um embuste.

Em 18 de outubro de 2007, tendo por base um texto do Carlos Chagas publicado na finada Tribuna da Imprensa, eu me atrevi a desmascarar o embuste do horário de verão. Repasso a vocês o meu texto, desta vez revisado e ampliado.

[Horário de verão?] Eu detesto! Até não é pelo fato de ter que acordar mais cedo, etc. É pela ignorância dessa medida. Ela não visa economizar energia elétrica, ou água nos reservatórios das usinas, ou o que quer que você pense. Os motivos são bem outros...

O primeiro motivo é que não é possível economizar energia elétrica, ao menos não no nível em que estamos falando aqui. Dou alguns exemplos:
  1. Energia elétrica não pode ser armazenada para utilização posterior. Você pode fazer isso no seu carro quando transforma parte da gasolina queimada em energia química na bateria — esta sim, reversível —, ou quando armazena parte da energia disponível em sua casa na bateria recarregável do celular. Em que pese ser possível, as perdas e custos envolvidos no processo tornam este armazenamento inviável, como ainda é o caso dos carros elétricos
  2. Nossa matriz energética também não contribui para tal "economia de energia". Neste caso especial, a estupidez da medida se mostra por inteiro. Energia elétrica é, na verdade, energia mecânica transmitida eletricamente. Dessa forma, quando você liga uma lâmpada ou um motor na sua casa, é a energia mecânica da água que desce do reservatório e gira a turbina que produz o "milagre" da luz se acender ou do motor girar. Entenda a coisa assim: se todos os dispositivos elétricos ligados a uma determinada usina fossem desligados, as turbinas da usina girariam como o motor de um carro em ponto morto. Grosso modo, todo o combustível do carro seria gasto mas ele não sairia do lugar.
  3. Então, quando se economiza energia elétrica no Brasil — via de regra — economiza-se água no reservatório. Lamentavelmente, tal economia se dá nos meses de maior pluviosidade (chove muito de Outubro a Fevereiro no Brasil) e a energia economizada (água) vai sair pelo ladrão (vertedouro, como é chamado nas usinas). Seu esforço foi, na verdade, para nada. Lamento.
  4. Por que então outros países usam o horário de verão? Ora, porque lá eles economizam de fato. A matriz energética dos países do hemisfério Norte é carvão, petróleo e gás. Assim, a energia elétrica economizada se traduz no carvão, no petróleo ou no gás economizado. Explicando melhor: a energia poupada hoje pode ser gerada amanhã com os mesmos recursos — eles não passarão por cima do vertedouro em momento algum.
  5. Vocês ainda podem dizer — e estarão certos — que também no Brasil temos termoelétricas que usam carvão ou petróleo ou gás. Verdade! Lembrem-se, contudo, que a maioria delas se localiza nos estados do Norte, Noroeste e Nordeste que não participam do horário de verão. É bestial!
O outro e principal motivo é diminuir a demanda de energia (a carga instantânea na rede) nos momentos de pico de consumo. Não vou entrar em detalhes sobre estes tais "momentos de pico", mas só naquilo que eles produzem. Os picos de consumo geram perda de energia nas linhas de transmissão, sejam elas de alta ou baixa tensão. Esta é uma perda das companhias distribuidoras, não sua, já que você só paga a energia que passa pelo medidor de consumo. Você até paga muito mais por kilowatt-hora (kWh) consumido em função disso. Entretanto, as distribuidoras de energia elétrica querem repassar suas perdas – um risco normal de negócio – para nós, tal e qual fizeram no ano do Apagão e nos subsequentes, lembra-se?

Quando eles adiantam o seu relógio em uma hora, as companhias distribuidoras desviam parte do pico de consumo para uma faixa de demanda menor. Distribuindo a carga eles racionalizam suas perdas. Bom, até aí eu entenderia, mas seu consumo médio vai subir, ao invés de cair, como se esperaria num programa de economia. Você acenderá luzes nas manhãs ainda escuras e se manterá acordado e ativo por mais tempo. O seu "dia útil" ficará maior, você consumirá mais energia (e esta energia você pagará integralmente), descansará menos (sua saúde pagará também por isso) e as distribuidoras lucrarão muito mais (consoante com sua intenção). Para elas, o horário de verão não é uma benção: é um maná!

E por que? Porque elas não precisarão fazer investimentos construindo novas linhas, contratando mais pessoal, melhorando seu serviço. Elas irão faturar mais com o mesmo capital investido – uma alavancagem. O governo, que poderia e deveria fazer algo útil, faz nada!

Quando se vive num país que recebe a maior carga de insolação do planeta e não existem linhas de crédito oficiais para, por exemplo, subsidiar a construção e instalação de aquecedores solares, tanto em residências como na atividade produtiva, o que acabaria com boa parte desses "picos de consumo", estenderia a vida útil da rede de distribuição de energia por mais 10 ou 20 anos, economizaria dinheiro e pouparia o meio ambiente ao evitar a construção de usinas geradoras e linhas "a toque de caixa". Isso tudo e outras barbaridades como a corrupção e o superfaturamento, comuns nessas obras. Logo, logo a gente entende que nada disso aí é feito em nosso nome ou para nosso proveito. É só uma outra mão no nosso bolso.

E todo dia eu acordo e vejo que ainda estou no mesmo Brasil.

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