Confesso que me encontro afastado dos assuntos europeus. Minha última opinião, salvo falha de memória, foi em relação ao Brexit. Mas hoje, uma manchete do jornal Valor — equivocada a meu ver — assinalava uma aproximação do candidato Macron em relação à Marine Le Pen, a candidata que tira o sono da elite globalista europeia.
Resolvi escovar meu claudicante Francês e passei os olhos pelo Le Monde, Le Figaro e por algumas publicações alternativas. Do primeiro uma interessante lista alfabética (pelo sobrenome) dos onze candidatos, duas mulheres e nove homens que disputam o trono francês.
N. B.: as classificações de viés político são minhas, e não aquelas eventualmente declaradas pelos candidatos. (grifos meus)
- Nathalie Arthaud (Lutte ouvrière — Luta aberta)
- Viés: extrema-esquerda, socialista
- Programa: assistencialismo trabalhista, luta contra a tirania do capital e exploração patronal.
- Pitaco: Está na sua 12ª candidatura e dela nunca ouvi falar! A insignificância subiu-lhe à cabeça.
- François Asselineau (Union populaire républicaine - União popular republicana)
- Viés: centro-direita, conservador
- Programa: Retirada da França da União Europeia — Frexit, alinhamento com os Estados Unidos da América.
- Pitaco: funcionário público de carreira, ex-inspetor de finanças e ex-funcionário de vários gabinetes ministeriais, graduado pelo HEC e ENA, parece-me um natural apoiador da candidatura Le Pen.
- Jacques Cheminade (Solidarité et progrès — Solidariedade e progresso)
- Viés: direita, conservador
- Programa: Retirada da França da União Europeia — Frexit e da OTAN, alinhamento com os Estados Unidos da América.
- Pitaco: auto-denominado "anti-sistema", é um candidato que poderia ser classificado como histriônico. Sem qualquer chance real, acredito que sequer seu apoio seja bem-vindo em qualquer candidatura principal. Já votos num segundo turno, ninguém dispensa. Suas posições me lembraram o Enéas.
- Nicolas Dupont-Aignan (Debout la France — Levanta-te França)
- Viés: centro, populista
- Programa: Colocar-se como alternativa entre o radicalismo de Le Pen e o socialismo de Fillon.
- Pitaco: político de carreira, graduado pela ENA, parece-me um demagogo profissional com tinturas nacionalistas. Pode se aliar a qualquer um, mas não defende o Frexit .
- François Fillon (Les Républicains — Os Republicanos)
- Viés: centro-esquerda, socialista
- Programa: assistencialismo moderado a reformista, prega o fim da jornada de 35 horas semanais, aposentadoria aos 65 anos, redução de 500 mil funcionários públicos e ISF (imposto sobre fortunas), revisão do código do trabalho e ainda a reforma da assistência de saúde. Pró-UE. Programa ambicioso e de concreção duvidosa, que mistura pragmatismo e assistencialismo. Político profissional, já ocupou todos os cargos da República exceto a Presidência. Seu programa é de ruptura com o do seu próprio partido, o que sugere demagogia. Se não for finalista fechará com Macron.
- Benoît Hamon (Parti socialiste — Partido socialista)
- Viés: extrema-esquerda, socialista
- Programa: Não tem um programa específico além das propostas de radicalizar as medidas que fracassaram o governo que finda.
- Pitaco: vencedor-surpresa das primárias do partido. Ativista estudantil e anti-racista, herda o imenso fracasso do governo Hollande, mas defende a expansão de suas metas e meios. Como rotulei François Hollande de demagogo antes de sua eleição, acredito que Benoît seria um demagogo em esteroides. Vai transformar o socialismo francês num PSOL.
- Jean Lassalle (Résistons — Resistimos)
- Viés: esquerda, socialista e ecológica
- Programa: Não tem um programa específico mas se declara "defensor dos territórios rurais e de uma ecologia humanista", o que quer que seja isto. É prefeito de uma minúscula cidade (160 habitantes) nos Pirineus e é mais conhecido por ter feito uma greve de fome por 39 dias contra a transferência de uma usina para 65 km. além.
- Pitaco: candidato difícil de analisar: nunca fez nada, não propõe nada, não é nada… Parece ser uma Marina Silva da França só que sem votos. Dona Marina também não os teria se militasse na França. Pode apoiar a qualquer um com seus 160 votos.
- Marine Le Pen (Front national — Frente nacional)
- Viés: direita, conservadora
- Programa: Atualmente à frente na preferência dos eleitores, ela defende a retirada da França da União Europeia — Frexit, restabelecer o Franco como moeda nacional, redução da carga tributária e da influência e ingerência do Estado na economia, nas relações entre capital e trabalho e na assistência social, muito similar às propostas de Trump para os EUA.
- Pitaco: ao contrário do que alardeiam nossos pundits, acredito que Le Pen será vitoriosa onde seu pai Jean-Marie fracassou várias vezes. Alia pragmatismo e nacionalismo com moderação. É a única dentre os candidatos a denunciar o imenso malefício que a imigração desordenada trouxe ao seu país, especialmente imigrantes islâmicos. O recrudescimento do terrorismo em solo francês — 2 homens, pai e filho, degolados; 1 homem esfaqueado por 3 jovens islâmicos; 1 terrorista morto em Orly ao atacar um policial — eventos acontecidos ontem e hoje, contribuem para o crescimento de sua campanha.
- Emmanuel Macron (En marche ! — Pra frente!)
- Viés: centro-esquerda demagógica
- Programa: "Nem direita, nem esquerda", o principal oponente de Le Pen acena com o apontamento correto de problemas reais, contemplando educação, desemprego, aposentadoria e segurança, porém apresentando soluções através de intervencionismo estatal.
- Pitaco: a França já tem seu Kassab, vulgo o Cafta! Macron, entretanto, tem uma boa estratégia eleitoral já que o programa de Le Pen encerra uma ruptura com o modelo estatizante e paternalista de sempre e ele pretende resolver os problemas franceses usando o mesmo veneno que os criou. E eu pensei que Hollande era um demagogo profissional. É o queridinho da Globo.
- Jean-Luc Mélenchon (La France insoumise — A França rebelde)
- Viés: extrema-esquerda, eco-desvairada
- Programa: Prega a necessidade de uma nova constituição para a França, o banimento da energia nuclear, adoção de uma CPMF (sem o "P"), manutenção da União Europeia com revisão de vários tratados, fixação de um salário máximo (genial!), direito ao emprego ("O Estado dará emprego a todos desempregados") e por aí vai.
- Pitaco: de longe é o mais histriônico de todos, difícil até de classificar, um verdadeiro "samba du crèole fou" ou coisa assim. Entretanto seu programa tem acertos. A meu ver, a União Europeia precisaria apenas de ajustes processuais, alterações de tratados e até mesmo o abandono do Euro como moeda única, e não um simples chute no pau da barraca como foi o Brexit e também serão o Frexit, Nexit etc… Muito se investiu neste projeto para ser jogado fora assim.
- Philippe Poutou (Nouveau parti anticapitaliste — Novo partido anticapitalista)
- Viés: extrema-esquerda, sindicalista
- Programa: Não tem um declarado, mas dizem que ele é muito simpático, o que o faz uma espécie de Lula francês..
- Pitaco: suas ambições não vão muito além daquelas que ele defende na fábrica da Ford onde diz trabalhar. Já militou no partido Lutte ouvrière de Mme. Arthaud, mas preferiu algo mais à esquerda, ainda que tenha evitado termos como "comunista" ou "socialista radical" em favor de um anódino "anticapitalista". Como Lula, não passa de um pelego.
E assim, após horas extenuantes de pesquisa, tradução e reflexão, chego ao final dessa breve análise das candidaturas à presidência da França. O futuro dirá se eu li corretamente os perfis de cada candidato no Le Monde, ou se este pasquim fez uma cobertura isenta. Quem viver, verá. Au 'voir!
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