sábado, 1 de outubro de 2011

A justiça se espinha

Na mesma linha do post anterior — O poder e o que ele faz às pessoas —, os togados do STF se espinharam quando a ministra corregedora Eliana Calmon disse que "há bandidos escondidos atrás da toga". Não sei porque. Primeiro, porque é verdade: há bandidos entre os togados. Segundo, porque não é um privilégio dos tribunais ter bandidos em suas hostes: eles (os bandidos) habitam todos os níveis dos mais diversos segmentos da sociedade. Assim, quando o meritíssimo ministro Cezar Peluso proferiu seu veemente discurso intimidatório contra a corregedora (ela não foi citada, mas todos sabiam quem era o alvo), tudo o que ele conseguiu foi chamar a atenção para os bandidos de toga. No jargão popular, vestiu a carapuça. Ah, vestiu sim!

Outro que tomou as dores da sacrossanta corporação foi o Celso Mello. É brilhante magistrado, mas vez por outra escorrega na própria empáfia; efeito colateral da exposição ao poder, acredito. E o maioral, o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil, Henrique Calandra, que moveu a ação no Supremo para tirar os poderes do Conselho Nacional de Justiça. Juiz não gosta de cumprir a lei quando o efeito desta recai sobre ele, ah não.


Então, por que o judiciário não aplica para si aquilo que preconiza para os outros? Será que ele se considera assim tão melhor? Mais branco? Mais limpo? Pois não é! É apenas e tão somente uma das partes úteis da sociedade, uma engrenagem se quiser, mas só isso. Do judiciário — e especialmente dele que conhece a Lei intimamente — se espera o seu cumprimento e o respeito irrestrito da legislação. É agravante séria quando um homem da Lei usa este saber para burlar e distorcer seus efeitos, ação torpe e hedionda.

Pois bem, sabemos que isso ocorre. Tanto ocorre que Daniel Dantas proferiu a célebre frase "Só tenho medo da polícia e da primeira instância. Lá em cima eu resolvo." A tradução não pode ser outra: "quanto mais longa a toga, mais seguro o porto." Foi usando-as que Dantas, Dirceu, Sarney e até aquele juiz Lalau (prova viva que juiz come bola) se safaram. Onde está o processo contra a quadrilha dos mensaleiros? Quer saber? Está perto da prescrição, porque uma toga conveniente sentou-se em cima e de lá não saiu.


Pra terminar: os juízes de bem e sua Associação dos Magistrados do Brasil, deveriam enaltecer a existência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É por se permitir ao escrutínio que a instituição se torna confiável e crível. Aproveito para retirar uma pequena parte do discurso que Sua Santidade o Papa Bento XVI proferiu ao Bundestag, no último dia 22:
A política deve ser um compromisso em prol da justiça e, assim, criar as condições de fundo para a paz. Naturalmente um político procurará o sucesso, sem o qual não poderia jamais ter a possibilidade de uma ação política efetiva; mas o sucesso há de estar subordinado ao critério da justiça, à vontade de atuar o direito e à inteligência do direito. É que o sucesso pode tornar-se também um aliciamento, abrindo assim a estrada à falsificação do direito, à destruição da justiça. «Se se põe de parte o direito, em que se distingue então o Estado de um grande bando de salteadores?» — sentenciou uma vez Santo Agostinho (De civitate Dei IV, 4, 1).
Íntegra do discurso aqui.
Bando de salteadores? Ui! Essa doeu...

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