Nesse ínterim, governos (a batata quente foi passada para as competentes mãos da Mãe do PAC) e ANTT já modificaram exigências "pétreas" do projeto. Por exemplo, o custo máximo inicial estabelecido de R$ 33,1 bilhões e comprometimento máximo de 60% (R$ 19,9 bilhões) de recursos públicos (i.e. nosso dinheiro) já está sendo repensado para algo na casa de R$ 50 bilhões e 100% de recursos públicos. Opa! Afaste de mim essa mão grande.
Felizmente para nós, e após 4 (quatro) licitações sem qualquer interessado (por que só Lula-Dilma veem a necessidade de tal geringonça?), a 9ª Vara Federal da Justiça Federal, em Brasília, determinou a suspensão imediata de todos os procedimentos administrativos feitos para viabilizar a licitação do trem de alta velocidade (TAV), projeto que pretende interligar as cidades do Rio de Janeiro e Campinas. Espero que tenha sido a pá de cal nessa estultice.
Sou contra porque existem outras urgências a serem atendidas, muito mais imediatas e necessárias, como reinstalar o sistema ferroviário do País. Só a título de exemplificação e sem qualquer ordem de prioridade, eu cito:
- Não há um único aeroporto no Brasil que tenha ligação de trens (metrô ou suburbano) entre seus terminais e às cidades que serve, nem mesmo São Paulo. Gasta-se mais tempo nas rodovias de acesso que em viagens de longo curso. Se chover então...
- São Paulo — uma das maiores cidades do mundo em população e área — está na sua 5ª linha de metrô. Paris, uma cidade bem menor, tem 14 linhas além de uma rede de trens suburbanos (RER) e de ônibus de dar inveja. Comparar uma com a outra é covardia.
- Belo Horizonte (para citar um caso próximo) — passados uns 40 anos — tem hoje um arremedo de metrô, na verdade o antigo suburbano com estações e vagões melhorados. O serviço de trens suburbanos, ao qual substituiu, atendia a uma região bem maior e parte da linha é compartilhada com trens de carga. Mesmo a rede de bondes, que existiu até os anos 60, atendia a quase toda a cidade e mesmo à recém-criada Pampulha. As queixas àquele sistema eram devidas à má qualidade do serviço de fornecimento de energia elétrica, não ao serviço em si.
- Rio, São Paulo, Belo Horizonte — para me limitar às maiores capitais — já foram interligadas por ferrovias. Inexplicavelmente, o serviço foi descontinuado. Assim, ao invés de se fazer melhoramentos na malha ferroviária, duplicação e eletrificação de linhas, desativa-se o sistema. Aqui mesmo, perto de minha casa, passava uma linha de trens. Por esta linha, Belo Horizonte e o Sudeste estavam ligados à Bahia e ao Nordeste por um ramal e à Brasília e ao Centro-Oeste por outro. Hoje, é apenas para cargas e os trens circulam apenas com o maquinista. Pasmem, é o próprio maquinista que para a composição e troca as chaves de linha.
- Paro por aqui, mas é bom que se reflita sobre o fato de que tínhamos mais ferrovias no tempo do Império que agora. Hoje, temos apenas mais balas... infelizmente.
Eu já tive oportunidade de viajar em trens rápidos, no caso o TGV francês. Numa viagem entre Paris-Amsterdam, notei a estupenda velocidade do trem no trecho entre Paris e Bruxelas, algo em torno de 1 hora! Entretanto, a partir de Antuérpia (ainda na Bélgica) a composição passa a progredir em velocidade de uma tartaruga manca, possivelmente devido à sinuosidade da linha e às muitas pontes, apesar do terreno absolutamente plano. A velocidade volta a aumentar um pouco na Holanda mas nada como os mais de 300 km/h pelos campos do norte da França.
Assim, mais do que poder comprar o brinquedo, o Brasil precisa escolher bem onde ele vai funcionar. É bem possível que — como nos Estados Unidos — não estejamos talhados para esses trens. Acredito ser bem mais plausível e útil, linhas convencionais mais modernas, duplicadas onde for possível e necessário, preferivelmente eletrificadas, e que revertam em benefício da população e do País.
Eu sei que Lula vem de uma infância pobre e sofrida — nunca lhe neguei a origem nem o mérito da sua maior conquista — mas acho que ele já tem idade para não querer brincar de trenzinhos. Se, mimado como é, achar que ainda deve, que não o faça às nossas custas. Temos um País para manter e o dinheiro não está aí para brincadeiras.
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