quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Por um pouco de conservadorismo

Não faz assim tanto tempo, o Brasil tinha partidos conservadores, ou "de direita". Hoje, eles estão entre as espécies em extinção e isso não é bom. Na verdade é péssimo! Dentre a miríade de partidos que povoam a fauna política do Brasil, apenas dois se identificam, envergonhadamente, como conservadores: o PP (Partido Progressista, ex-PDS e ex-ARENA) e o DEM (Democratas, ex-PFL — Partido da Frente Liberal). Todos os demais se dizem "de esquerda", centro-esquerda ou de centro (e.g. o recém criado PSD — Partido Social Democrático, mais conhecido como o Partido do Kassab — PK —, uma agremiação de dissidentes do DEM e outros partidos. A nossa Política, assim distribuída, é animal coxo, isso se já não estiver irremediavelmente perneta.

A política nacional, já um ente pouco representativo da sociedade, consegue se tornar ainda menos representativa. Afinal, é lícito assumir que a sociedade tenha representantes de todas as alas, não apenas de "progressistas". Para ser bem honesto, a política nacional só tem representado a si mesma, especialmente (ou descaradamente) desde o advento da Era Lula. A meritocracia incipiente foi substituída pelo assistencialismo populista, os compromissos de Estado pelo discurso fácil e fátuo. Quanto ao povo, a maioria ignara comprou e pagou a farsa. Um artigo do Estadão retrata bem esse vácuo social. Grifos meus:

'PSDB precisa assumir-se como partido de centro-direita'
Estudiosa americana diz que a própria legenda fez essa escolha nos anos 90 e que retomá-la seria um bem ao debate político
GABRIEL MANZANO , ROLDÃO ARRUDA - O Estado de S.Paulo

No momento em que o senador Aloysio Nunes Ferreira (SP) expõe publicamente, via Twitter, a carência de um rumo claro para o seu PSDB, a professora americana Frances Hagopian, uma estudiosa dos partidos brasileiros, se arrisca a oferecer um norte aos tucanos: ocupar o espaço da centro-direita no espectro ideológico.

Hagopian não está sozinha. "Ela disse a verdade", endossou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ao ser informado pelo Estado da entrevista concedida pela americana.

"Acredito que eles (os tucanos) podem se destacar nesse espaço de centro-direita, se tiverem coragem para fazer isso", afirma a professora da Universidade Harvard. "Precisam mostrar o que fizeram, ser fiéis a si mesmos", completa ela, referindo-se às transformações capitaneadas pela PSDB na gestão FHC (1995-2002)

A receita, no entanto, não é novo, avisa ela. "Na Inglaterra, Tony Blair levou os trabalhistas para o centro e deixou os conservadores sem chão. No Chile, a Concertación criou uma ampla agenda que confundiu os partidos."

Em São Paulo, onde participou com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso de um debate no Centro Ruth Cardoso, ela falou ao Estado semana passada: "Por toda parte há muita insatisfação com a política, mas isso é parte do jogo. As coisas ficaram assim por causa da rapidez da globalização. Não temos um governo mundial, mas temos uma economia mundial, em que as soluções nacionais são lentas e ineficazes".

Há uma grande insatisfação, no Brasil, com os partidos e os políticos. O governo tem uma aliança de 14 partidos, manda demais, domina o Legislativo...

É a mesma queixa que se faz no Chile, em países da Europa, até nos Estados Unidos. Lá a Casa Branca envia uma reforma da saúde, ou leis para o meio ambiente, e elas ficam 18 meses, até mais, encalhadas. Isso de fato complica a democracia, pois os governos acabam não dando respostas a questões urgentes da sociedade. Mas acho que, no geral, a democracia amadureceu por aqui, está melhor do que há 20 anos. Os partidos, pelo menos os grandes, se fortaleceram. Refiro-me a dois ou três, os âncoras, com grandes bancadas e com presidenciáveis.

Um desses âncoras, o PSDB, vive um momento difícil. O PT incorporou as bandeiras da social-democracia e ele perdeu espaço, votos e o discurso. De que modo deveria reagir?

Nos anos 90, na Inglaterra, ocorreu o mesmo. Tony Blair levou o Partido Trabalhista para o centro e os conservadores ficaram sem chão - e isso durou 15 anos. Também no Chile se fez a Concertación e foi a mesma coisa. Isso é parte do jogo.

Mas aqui o PSDB precisa encontrar um rumo. De que modo?

O que a democracia social viveu aqui foi interessante. Por razões ideológicas, que eu entendi, o partido deu um primeiro passo à direita, para reformar o Estado. Perceberam que não dava para avançar em saúde ou educação com um Estado desestruturado, na bancarrota. Precisavam recuperar a solvência fiscal, vender as empresas de aço, depois outras, fazer uma reforma administrativa, a previdenciária. E veja, foi o PSDB que deu essa guinada para a centro-direita. Pois agora devia assumir o que fez, valorizar metas como os investimentos na infraestrutura, sanear o sistema fiscal. Acredito que eles podem destacar-se nesse espaço, de centro-direita, se tiverem coragem para fazer isso.

Mas uma guinada para a direita, por menor que seja, é política e eleitoralmente arriscada. No Brasil 'é proibido' ser de direita...

Não estou dizendo que um partido da social-democracia deva "se reinventar" como partido de direita. A coragem de que falo é para debater metas concretas, ousadas. Seria um bem para o País. O debate político aqui tem áreas de consenso, como melhorar a educação, que é tarefa urgente para se chegar à justiça social. Mas você pode ter um grande projeto, que inclua novas reformas, modernizar portos, atacar de fato toda a infraestrutura. Isso pode ser feito de diferentes maneiras, e uma delas é diminuindo o tamanho do Estado, para recuperar recursos e destiná-los, aí sim, às urgências sociais. Como se vê, estas são causas da social-democracia. Sei que isso nos leva a outra questão, que é a de definir o que é uma social-democracia em 2012. É um bom debate. Sabemos que ela é certamente diferente dos anos 90 ou dos anos 70. O País teria muito a ganhar abrindo essa discussão.

Como fica o PT nesse cenário?

O problema das esquerdas, como já se viu na Europa, sempre foi descobrir como se manter fiel às suas bases e moderar o discurso para ganhar eleições. O PT fez isso em 2002. No longo prazo, esse movimento para o centro pode matar sua identidade como partido de esquerda. Se isso se agravar, aparece outro partido de esquerda e lhe toma o lugar. A propósito, lembro-me de um artigo do Thomas Friedman, que veio ao Brasil e escreveu que Lula e FHC faziam uma dança do tipo nado sincronizado. E atribuiu essa dança à globalização.

Marina Silva tentou criar uma alternativa, em 2010, e chegou aos 20% do eleitorado. Há os indignados na Espanha e protestos de jovens por toda parte. Para a sra., o que isso representa?

Não acho que a crise seja no modelo político. Eu não ligaria os votos de Marina aos indignados da Espanha. Se há uma crise, é econômica, uma crise de globalização. Não temos um governo mundial, mas sim uma economia mundial. A economia muda mais rápido do que os governos conseguem regular. Pactos vão caindo e as pessoas se sentem inseguras. Mas não vejo como superar isso com políticas nacionais ou de partidos.

Enfim, a sra. acha que a insatisfação política no Brasil é apenas parte de uma crise maior?

Eu não acho que o Brasil esteja vivendo uma crise. Há diferenças de opinião, dentro da normalidade. E olhe que, hoje, a normalidade não é pouca coisa.

Optei por reproduzir todo o texto para não comprometer a ideia contida nele. Certas coisas que foram ditas, na minha modesta opinião, são verdades cabalares. Primeira, a de que o PT deu um passo em direção ao centro para viabilizar sua eleição.Pode-se dizer que foi uma prestidigitação sem a qual o partido de esquerda "batia na trave" mas nunca fazia o gol. A daqui se chamou "Carta ao Povo Brasileiro". Fizeram o mesmo no Peru para a campanha do Ollanta Humala, aliás, sob supervisão do petista Felipe Belisario Wermus, vulgo Luis Favre. Engraçado como militante esquerdista sempre tem mais de um nome... 

A segunda, foi o movimento à direita do PSDB, isto é, para viabilizar o atendimento "às urgências sociais", precisou-se "sanear" o país através de uma política conservadora. O efeito benéfico das privatizações foi eclipsado pela política de juros e de responsabilidade fiscal. O PT e demais partidos "progressistas" aproveitaram-se disso para satanizar a "direita", isto é, o PSDB e o PFL, logrando êxito. Estranhamente, nenhum político desses partidos (PSDB/PFL) manifestou-se em defesa dos próprios atos — FHC foi deixado à própria sorte. Ainda hoje, passados mais de oito anos, peessedebistas se envergonham daquele "passo à direita".

Isso é incompreensível para mim. Afinal, o país deu um salto qualitativo sem par em sua história. Alguém aí se lembra do quanto custava uma linha telefônica? O quão difícil era comprar uma, pagando-se por anos a fio e esperando mais um par de anos antes de poder contar com a linha. E os celulares? Chegou a comprar algum quando a operadora era uma estatal? Lembra-se de como eles quase nunca funcionavam porque eram poucas as antenas repetidoras? De quatro montadoras de veículos passamos a quatorze em poucos anos — aumentou-se a oferta e a competição; e muito mais.

Ainda hoje eu vejo pessoas criticando a privatização da Vale, para citar apenas a joia da coroa. Ela hoje paga de impostos, anualmente, mais do que o valor pelo qual foi privatizada. Os empregos saltaram de 13 mil para 41 mil (antes, mais "cabides" que empregos de fato), seu faturamento em 2009 foi de US$ 46,5 bilhões e seu valor atual de mercado é de US$ 160 bilhões. Pela Bolsa, a Vale que valia R$ 1,28 por ação ordinária e R$ 1,30 por ação preferencial, quando vendida, vale agora R$ 41,98 (ON) e R$ 38,79 (PNA), em plena época de baixa nas bolsas de todo o mundo. Mesmo descontando-se a inflação do período, obtém-se uma valorização real de 1.262,32% nas ON e de 1.139,44% nas PN. Estivesse ainda sob gestão governamental, ela jamais alcançaria tais níveis. Isso — para mim — é que é ser Progressista; o resto é firula e proselitismo barato.

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