domingo, 30 de outubro de 2011

O exame da OAB e minha pitada de mostarda

Escuto essa conversa desde que cursei Direito há uns bons anos. Não, eu não me formei. Descobri na segunda metade do curso que advocacia não seria a minha praia. Certas profissões exigem algo além do mero conhecimento e advocacia é uma delas — faltou-me estômago. Medicina é outra. Passar seis anos numa faculdade — por melhor que seja — não faz do aluno um bom médico, menos ainda um especialista. Para piorar o quadro, em cada porta de garagem surge uma nova "faculdade". Sem medo de cometer uma injustiça, a imensa maioria delas, senão a sua totalidade, meras arapucas para tomar dinheiro de incautos.

É bom que se diga que a OAB, que não exigia qualquer exame de proficiência, foi forçada a adotá-lo pela péssima qualidade dos formandos que obtinham o registro para advogar. Muitos não sabiam sequer escrever o Português, menos ainda redigir uma inicial. Juízes recusavam petições e recursos simplesmente por não conseguir entender o que estava escrito no papel. Pergunto: você gostaria de ser representado por um "advogado" desses? Creio que não. Assim, o Exame da Ordem surge como uma medida profilática e sanitária, nada mais.

Pois bem, a OAB vem sendo bombardeada com ações em várias instâncias contra o tal exame. Uma, questionando sua constitucionalidade (ADI), foi julgada pelo Supremo. O exame foi considerado constitucional; fim das querelas. Mesmo assim — e como diz o título — Ich möchte für meinen Senf (quero por minha mostarda; dar meu pitaco).

Na ADI movida pelo advogado Ulysses Vicente Tomasini, em nome do bacharel João Volante, sustentava-se que "o exame limita o exercício livre da profissão" e "a OAB não tem legitimidade para exigir uma prova de quem já se formou", isto é, para ele "a educação é que qualifica, não uma prova imposta pela organização de classe". Está assim na imprensa.

Na minha imodesta opinião de leigo, uma tremenda bobagem! Primeiro, porque o exame não limita ninguém de trabalhar. Existem milhares de bacharéis trabalhando por aí, auferindo postos e rendimentos compatíveis com sua formação superior. Assim, logo de cara, a afirmação não se sustenta. O que a Ordem qualifica e outorga é a prerrogativa de um bacharel em Direito representar pessoas e seus interesses perante um juízo. Ponto.

Vocês perceberam que a diferença nem mesmo é sutil; é bem clara! A instituição de ensino, devidamente licenciada e fiscalizada pelo MEC, qualifica o aluno como bacharel não como advogado. A ele é permitido auferir todas as benesses do posto, mas, para falar em nome de outra pessoa em juízo ele precisará provar que está à altura da responsabilidade.

Ressalte-se, ainda, que à minha época prestávamos o exame com o conhecimento obtido na faculdade — não existiam esses "cursinhos" que pululam por aí — um claro sinal de que a qualidade dos formandos e/ou das escolas vem decaindo consistentemente, razão ainda maior para a manutenção do exame.

Exames como este são comuns em vários países e as razões são quase sempre as mesmas. Eu entendo que profissões regulamentadas (se há regras há limitação, outra premissa que desautoriza o advogado do Sr. Volante), deveriam sempre ser submetidas a exame de proficiência pelos seus pares, principalmente aquelas cuja imperícia na prática possa causar dano a terceiros. Como bem disse o ministro Celso de Mello no seu voto pela manutençao do exame (grifos meus),
"Não é, portanto, qualquer profissão que se expõe a possibilidade constitucional de intervenção regulativa do Estado, pelo contrário. Vê-se pois que profissões, empregos ou ofícios que não façam instaurar perigos à vida, à saúde, à propriedade ou à segurança de terceiros não têm necessidade de requisitos mínimos. Isso já é mostrado aqui desde a década de 10 e 20 do século passado assim como recentemente, em pleno terceiro milênio, quando votada a regulamentação da profissão de jornalista"
Este "quase bacharel" acompanha o brilhante voto do relator.

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